A MINHA E A SUA DORENSENIDADE
No município sergipano de Nossa Senhora das Dores, o dia 23 de outubro, desde 2010 (lei nº 170, de 22 de outubro de 2010), é dedicado à dorensenidade.
Foto: João Paulo Araujo de Carvalho
Mas, o que vem a ser dorensenidade?
Esta palavra é fruto da junção de duas outras: dorense (substantivo que designa o indivíduo natural ou residente em Nossa Senhora das Dores) + identidade (substantivo que remonta à representação simbólica de algo; ao conjunto de características que definem um indivíduo ou grupo de indivíduos).
Assim sendo, a dorensenidade faz referência a elementos que caracterizam o ser dorense.
Este é um termo, no entanto, que vai além de um mero conceito, tratando-se, portanto, de um sentimento: o orgulho de ser dorense. Sentimento de pertencimento que é uma via de mão dupla, pois, ao mesmo tempo em que o indivíduo se identifica como parte de um todo, o lugar no qual nasceu ou escolheu para viver; também percebe que este mesmo lugar integra seu ser, fazendo-o reconhecer-se como dorense por comungar de uma história e de uma cultura comum a outros milhares de conterrâneos. É uma tatuagem impressa no coração dos que vivem ou viveram na outrora “terra dos Enforcados”, depois município de Nossa Senhora das Dores.
O referido sentimento, no entanto, só pode ser despertado naqueles que conhecem esta história e esta cultura comuns, que com elas se identificam, percebendo-se como parte da mesma.
A construção da dorensenidade se dá, portanto, pelo entrelaçamento de memórias individuais e coletivas que vão dando sentido à existência do dorense no sagrado solo dedicado à Mãe das Dores, com suas tradições e histórias; com sua diversidade de fazeres, saberes e sabores; com as cores impressas pelos seus artistas; com os sons que formam a melodia de cada existência, no campo ou na cidade; com cada letra escrita por seus poetas e pesquisadores; enfim, nos recantos e encantos deste solo amado.
Poderíamos, assim, dizer que existem dorensenidades, a minha e a de cada um dos que leem estas linhas. Afinal, um sentimento é algo subjetivo, cunhado a partir de uma multiplicidade de percepções que cada componente do todo vai construindo em relação a ele e a si mesmo. É um sentimento único e ao mesmo tempo plural, pois converge para um querer bem aos lugares e às coisas que fazem com que nos identifiquemos como dorenses. E nos sentirmos orgulhosos disso.
Neste 23 de outubro, no qual celebramos também os 98 anos da elevação da sede do município de Nossa Senhora das Dores à categoria de cidade, reflitamos sobre nossas dorensenidades, deixemo-nos envolver neste sentimento de amor e orgulho, busquemos conhecer esta terra que nos viu nascer ou nos acolheu como mãe.
A minha dorensenidade passa pelas habilidosas mãos que produzem o beiju de tapioca, a bolachinha de goma, o sarôio, o pé-de-moleque quentinho, o doce de caju, a traíra torradinha na banha de porco, o pirão de galinha de capoeira ou o frito de maturi; pelo colorido do reisado e os sons dos pífanos; pela memória preservada no Museu Caipira e em lugares como a estrada do Candeal (palco do único processo crime instaurado em Sergipe contra o cangaceiro Lampião); pelas histórias do herói de guerra Theodomiro Alves de Campos (o Capitão Theo) ou do cordelista José Barbosa (o menestrel do Itapicuru); pelas paisagens da Tabúa, do rio Sergipe, da Furna, da cachoeira do Dangi ou das serras do Besouro e de Borda da Mata; pelo trabalho daqueles que formam o Projeto Memórias, a ONG Cultivar, a Academia Dorense de Letras (ADL) e o Grupo Ambientalista Dorense (GAD); pela devoção dos Penitentes, das beatas do Madeiro e dos frequentadores do Cruzeiro do Século; pelo verde, amarelo, azul, branco e preto da nossa bandeira; pelos bolos de milho, macaxeira e puba consumidos nas bancas da feira; pela beleza da igreja Matriz Nossa Senhora das Dores, o mais belo templo sergipano do século XX, e da fé de nossa gente nas graças vindas do céu pela intercessão da Mãe de Jesus; pelas lembranças das memoráveis disputas futebolísticas entre o Dorense (DFC) e o Flamengo (AEF); pelas brincadeiras de pião, marraia e pipa; pelo caldo de cana fresquinho feito pelo avô Jenival ou as inesquecíveis epopeias vividas e contadas pelo avô Orestes....
Estas são algumas das peças que ajudam a montar o mosaico da minha dorensenidade. Quais peças formam a sua dorensenidade?
Nossa Senhora das Dores, 23 de outubro de 2018.
João Paulo Araújo de Carvalho
(Professor, historiador e membro da Academia Dorense de Letras)
* Meu agradecimento ao Professor Dr. Denio Azevedo, por nos instigar à reflexão através do seu artigo "Sergipanidades" (publicado aqui no Facebook em 24 de outubro de 2017), e que foi por nós utilizado para iniciar debates com os alunos durante as primeiras semanas deste mês de outubro. O artigo que agora publico é resultado destas discussões.
Fonte: https://www.facebook.com/joaopaulohistoria/posts/1119848334841152